Dia do Trabalhador: o que mudou na lei e quais direitos ainda são pouco conhecidos no Brasil


Apesar das décadas de regulamentação e avanços legais, muitos trabalhadores ainda desconhecem seus próprios direitos
Myrian Pinheiro, ContilNet

1º de maio, Dia do Trabalhador, não é apenas uma data simbólica. É uma oportunidade para lembrar a luta de classes na história, a abordagem contemporânea dos trabalhadores brasileiros ao trabalho e os desafios que milhões de brasileiros ainda enfrentam. E, enquanto o trabalhador é construído no centro da sociedade e da economia nacional, apesar, ou talvez por causa, dos muitos avanços e retrocessos legais, com poucas exceções, muitas vezes é invisível ao olhar do Estado e da sociedade.


A oficialização do 1º de maio como feriado nacional no Brasil ocorreu em 1924, durante o governo do presidente Arthur Bernardes (1922–1926)/Foto: Reprodução

A data originou-se no movimento operário internacional: 1886, Chicago, EUA, onde uma greve geral foi organizada para reduzir a jornada de trabalho para 8 horas, um evento que terminou em repressão policial violenta, o “Massacre de Haymarket”. Como homenagem à luta e ao martírio dos trabalhadores, o 1º de maio foi celebrado como o Dia Internacional dos Trabalhadores.

A oficialização do 1º de maio como feriado nacional no Brasil ocorreu em 1924, durante o governo do presidente Arthur Bernardes (1922–1926), e representou uma virada importante na relação do Estado com o movimento operário.

Com a Revolução de 1930 e a ascensão de Getúlio Vargas ao poder, o 1º de Maio passou a ser institucionalizado. Em 1925, a data foi oficialmente reconhecida como feriado nacional, mas foi durante o Estado Novo (1937-1945) que o governo utilizou o 1º de maio como instrumento de propaganda trabalhista.

Vargas buscava legitimar o projeto de um Estado interventor, que conciliava capital e trabalho sob sua tutela, induzindo o desenvolvimento. Nesse contexto, o 1º de maio passou a ser comemorado com festas cívicas, discursos oficiais e anúncios de medidas populares. Foi em 1º de maio de 1940, por exemplo, que Vargas anunciou a criação do salário mínimo, uma das conquistas mais emblemáticas da legislação trabalhista.

A celebração do 1º de maio de 1943 entrou para a história como um dos momentos mais emblemáticos do trabalhismo no Brasil. Em ato simbólico e político, Vargas anunciou a promulgação da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) — um marco na legislação brasileira que unificou e sistematizou os direitos trabalhistas então dispersos em decretos e leis avulsas.

Direitos pouco conhecidos pelos trabalhadores

Apesar das décadas de regulamentação e avanços legais, muitos trabalhadores ainda desconhecem seus próprios direitos. Entre os mais ignorados, destacam-se:Intervalo intrajornada proporcional para jornadas inferiores a 6 horas (CLT, art. 71): trabalhadores com jornada entre 4 e 6 horas têm direito a 15 minutos de intervalo.
Dois intervalos de 30 min para lactante: para amamentar o seu filho, inclusive em caso de adoção, até que ele complete seis meses de idade. Esses intervalos são concedidos sem prejuízo do salário da trabalhadora.
A mulher tem direito a folgar aos domingos a cada 15 dias: a lei garante que as mulheres trabalhadoras não trabalhem dois domingos seguidos, como é realizado no caso do homem, que pode trabalhar até 03 (três) domingos por mês.
A ausência de depósitos de FGTS pode gerar rescisão indireta: o empregado pode requerer rescisão indireta (encerrar contrato como se fosse dispensado pela empresa) no caso de atraso nos depósitos de FGTS por mais de 03 (três) meses.
Horas extras têm limite: é permitido um acréscimo diário de até duas horas, nos termos do art. 59 da CLT, ou seja, o empregado deve cumprir no máximo duas horas extras por dia

O Trabalhador Brasileiro em 2025: A Continuação da Informalidade e da Desigualdade

Os últimos dados do IBGE (2024) mostram que o Brasil tem quase 100 milhões de pessoas em idade ativa, mais de 39 milhões das quais trabalham informalmente, sem carteira assinada e sem acesso a benefícios como Previdência Social, FGTS e férias remuneradas.

Além disso, as desigualdades raciais e de gênero continuam impressionantes: as mulheres ganham, em média, 20% menos que os homens, e trabalhadores negros estão mais expostos a subempregos e alta rotatividade. Os jovens em busca de emprego com idade entre 18 e 24 anos são os mais afetados, tendo que assumir seu primeiro emprego em um ambiente mais desafiador

Os Trabalhadores Invisíveis: Quem Cuida dos Cuidadores?

Fala-se em produtividade e competitividade, mas milhões de trabalhadores estão presos à margem da formalidade e da proteção social. Esses são os “trabalhadores invisíveis”: cuidadores informais, entregadores de aplicativos, catadores de materiais recicláveis, empregadas domésticas não registradas, vendedores ambulantes, diaristas e muitos outros.

Embora sejam cruciais para a reprodução social, esses trabalhadores não são apenas obscurecidos nas estatísticas oficiais ou nas políticas públicas, mas também são precários, desprotegidos por lei e, muitas vezes, discriminados.

Mudanças recentes nas leis trabalhistas: o que mudou e o que ainda precisa mudar

O Direito do Trabalho vem mudando a um ritmo cada vez mais acelerado na última década. Muito mudou desde a Reforma Trabalhista de 2017 (Lei nº 13.467). Aqui estão algumas das mais recentes:Acordos Coletivos: Acordos e convenções coletivas passaram a prevalecer sobre a lei em determinados aspectos, como jornada de trabalho, remuneração e outros direitos (Art. 611-A da CLT).
Possibilidade de parcelamento das férias: O parcelamento de férias foi permitido em até três vezes, o que antes era limitado a duas (Art. 134, § 1º da CLT).
Trabalho Intermitente: foi criado um novo tipo de contrato de trabalho, o trabalho intermitente, onde o trabalhador pode ter períodos de atividade e inatividade (Art. 443, § 3º da CLT).
Contribuição Sindical: a contribuição sindical passou a ser opcional, e não mais compulsória (Art. 579 da CLT).
Lei do teletrabalho (Lei 14.442/2022): regulamentação do trabalho em home office, que inclui direitos garantidos, como controle de tempo e fornecimento de equipamentos, inserindo o artigo 75-B na CLT.

Existem ainda mudanças esperadas na legislação trabalhista, são elas:Trabalho aos domingos e feriados: A Portaria nº 3.665/2023 introduz novas regras sobre o trabalho de domingos e feriados, onde, a partir de 1º de julho de 2025, a permissão para o trabalho nesses dias estará condicionada a acordos entre empresas e sindicatos.
Licença paternidade pode aumentar: A PEC 58/2023, que amplia a licença-maternidade de 120 para 180 dias e a licença-paternidade de 5 para 20 dias, incluindo casos de adoção, pode ser votada ainda em 2025, conforme agências do Senado.
Nova lei de trabalho por aplicativos: O projeto de lei 12/2024, que ainda está sendo debatido no Congresso Nacional em 2025, cria regras para remuneração mínima, contribuições previdenciárias e jornada de trabalho para motoristas e entregadores de aplicativos.

Um Futuro que Depende de Consciência e Luta Compartilhada

Neste 1º de maio, temos menos a comemorar do que a considerar. O Brasil implementou um sistema de leis trabalhistas, mas o desafio permanece em garantir que essas leis sejam aplicadas para todos. Educação, organização sindical e fiscalização são ferramentas críticas para defender os direitos que já foram conquistados e para expandir o potencial de justiça social.

Valorizar o trabalhador começa, sobretudo, com o reconhecimento de sua dignidade, de seus direitos e de sua história de luta.

Myrian Pinheiro, Advogada especialista em Direito do Trabalho
Por sinteactk
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